sábado, 23 de outubro de 2010

O método global integrado e o método analítico no futebol

A desinformação sobre os processos de ensino do futebol pode originar “crimes” pedagógicos.
Ao longo de décadas, e virando o século, muitos pesquisadores vêm estudando o ensino e desenvolvimento das habilidades técnicas nos esportes coletivos.
O objetivo impulsionador da maior parte dos estudos sempre foi o de entender como alcançar com os treinamentos a maestria desportiva e como maximizar o desenvolvimento técnico específico de jogadores e equipes.
A percepção de que a repetição sistemática de gestos nos treinamentos, para melhorar as habilidades técnicas de jogo nos esportes coletivos, não correspondia necessariamente, sob o ponto de vista cognitivo e neuromotor, à repetição do real gesto solicitado durante uma situação de jogo, trouxe à tona, a necessidade de se entender como tratar do desenvolvimento das habilidades técnicas, de maneira a atender a manifestação motora específica exigida no jogo.
Em outras palavras, além do habitual treino de repetição de gestos técnicos (de passes, cabeceios, chutes, etc.), tornou-se necessário o desenvolvimento de treinos que dessem conta, de não mais repetir apenas gestos, mas sim repetir sistematicamente ações (ações de passes, ações de cabeceio, ações de finalizações).
Desta maneira, métodos de ensino e treinamento da técnica nos esportes coletivos tornaram-se objeto de estudos e de aplicação.
No futebol, dentre os métodos amplamente estudados e utilizados, destacaram-se principalmente os métodos “analítico” e “global”.
 
O método analítico, herdeiro especialmente das práticas empíricas, foi nos primórdios do treinamento técnico, o principal método empregado por equipes de futebol; das escolinhas, passando pelas categorias de base, até o profissional. No Brasil é o método de raízes mais profundas.
O método global, oriundo do redirecionamento dos olhares da ciência, à prática esportiva dos jogos coletivos, foi ganhando um grande corpo de conteúdos e de interessados, e passou a ser estudado e empregado em centros onde “construir o talento” passou a ser uma necessidade e uma resposta as dificuldades de se “encontrar o talento”. Na Espanha encontrou seu principal porto de desenvolvimento (não só no futebol, mas também no futsal, basquetebol, voleibol e handebol).
Hoje, na prática do futebol, o método analítico se caracteriza pela realização de exercícios técnicos, com repetição sistemática de gestos, que são fragmentados e retirados do contexto circunstancial-situacional de jogo.
O método global por sua vez, se caracteriza pela repetição sistemática das ações (balizada pela aleatoriedade e imprevisibilidade do jogo) em contexto de jogo, integrando ao desenvolvimento técnico, o desenvolvimento tático individual e coletivo, bem como o desenvolvimento físico (enfim, o desenvolvimento do jogar).
A Ciência não nega os feitos e benefícios do método analítico, afinal, especialmente no futebol, muitos problemas ao longo da história, foram sendo resolvidos através dele.
Há, porém, que se destacar que as soluções dadas pelo método analítico deixaram lacunas, que até certo ponto, frearam o desenvolvimento dos jogadores. Isso gerou novas perguntas (novos problemas), que não poderiam ser respondidas com as mesmas respostas.
Infelizmente, muitos dos “gestores maiores” nos clubes de futebol (nas categorias menores ou no profissional), aqueles que tem poder de decisão para mudar o rumo das coisas, viveram uma época de aprendizagem em que a lição formal era dada pelo método analítico (sem se dar conta, muitas vezes, de que a lição que realmente lhe valeu frutos foi ensinada nas ruas, nas peladas das periferias, de um “jeito global”, que não era método).

Estiramento dos músculos posteriores da coxa

Muito se discute sobre o termo correto: distensão ou estiramento? Aqueles que defendem o termo estiramento justificam que a distensão é uma propriedade natural do músculo e que estiramento refere-se propriamente à lesão, ou seja, o fato de as fibras musculares terem sidas estiradas e posteriormente rompidas por um esforço produzido. Distensão é encontrado em livros de referência na fisioterapia e ortopedia e em alguns artigos técnicos. Aprofundaremos tais questionamentos, escolhendo falar das lesões em rupturas das fibras musculares por estiramento, utilizando assim a denominação atual sem desconsiderar o termo distensão.
Sendo assim, o estiramento muscular do grupamento posterior da coxa (isquiotibiais) é comum na prática do esporte. São assim denominados, pois têm sua origem muscular no ísquio (ilíaco) e a inserção na tíbia. Os isquiotibiais são: Bíceps da coxa, semitendinoso e semimembranoso. Estes cruzam duas articulações: quadril e joelho, daí sua complexidade, pois a capacidade dos isquiostibiais e do quadríceps em produzirem força conjunta é grande e dependendo da posição do joelho ou quadril pode produzir grande estresse ao músculo. Estudos indicam a junção músculo-tendão como o principal local da lesão, porém qualquer ponto ao longo do músculo é suscetível à lesão.
CLASSIFICAÇÂO
Estiramento de grau I
Algumas fibras musculares ou tendíneas são estiradas ou rompidas. O movimento ativo produz certa sensibilidade e dor. O movimento é doloroso, mas, em geral, é possível a amplitude de movimento total (poucas fibras são estiradas ou rompidas).O paciente queixa-se de sensibilidade dolorosa nos músculos posteriores da coxa, mínimo de edema e dor à palpação são previstos. Este paciente apresenta ciclo normal da marcha. A amplitude na flexão do quadril é normal. A flexão resistida do joelho e a extensão do quadril com o joelho estendido são, em geral indolores ou produzem sensação de tensão razoável.
Estiramento de grau II
Um número moderado de fibras são estiradas ou rompidas. A contração ativa do músculo é extremamente dolorosa. Em geral, há uma depressão palpável no ventre muscular. Pode-se ouvir um “estalido”. Presença de edema devido à hemorragia capilar. A palpação produz dor de moderada à forte. Observa ciclo anormal da marcha e o paciente não consegue tocar o calcanhar no solo. Limitação funcional pra flexionar o quadril e o joelho. O paciente tende a deambular com os joelhos flexionados. Apresenta também enfraquecimento para flexão e extensão resistida.
Estiramento de grau III
Estiramento grau III: Rompimento total das fibras musculares. Perda total de movimento. A dor é intensa no início, mas diminui com rapidez, devido à completa separação das fibras nervosas. Paciente relata ter ouvido um “estalido”. Este paciente é incapaz de deambular sem muletas. Apresenta força moderada na extensão resistida do quadril com o joelho flexionado, devido ao glúteo máximo. A resistência geralmente provoca dor.
MECANISMO DE LESÃO
Algumas teorias indicam a possibilidade de os isquiotibiais virem a sofrer estiramento, dentre os quais, destaco: Desequilíbrio com o quadríceps, fadiga, postura na corrida, discrepância de comprimento de membros inferiores, diminuição da amplitude de movimento, desequilíbrio entre os músculos isquiotibiais medial e lateral, porém é a contração rápida e explosiva, que fundamentalmente, proporciona o surgimento da lesão. Estudos apontam ainda, para o fato de que o semitendinoso, o semimembranoso e a cabeça longa do bíceps femoral serem inervados pelo ramo tibial do nervo ciático, enquanto a cabeça curta do bíceps da coxa é inervada pelo ramo fibular do nervo ciático. Isto é de fundamental importância e faz da cabeça curta do bíceps um músculo completamente distinto dos demais.
Vemos também que os estiramentos do semimembranoso e do semitendinoso podem ocorrer durante a desaceleração da corrida, enquanto os estiramentos da parte lateral inferior do bíceps da coxa ocorrem no desprendimento do pé ou de impulso da corrida.
TRATAMENTO
Após tratamento inicial na fase aguda da lesão, com gelo, repouso, elevação, uso de antiinflamatórios, ultra-som pulsátil, TENS e laser, inicia-se a recuperação do movimento ativo, com carga que não produza dor. Alternar exercício em cadeia cinética aberta para exercício multiarticular em cadeia fechada, com 30s de repouso mostrou facilitar a rápida recuperação e retorno antecipado à atividade. Observar, a inclusão dos exercícios de alongamentos, fundamentais na recuperação da lesão. O alongamento deve ser seguido pelos exercícios indolores de fortalecimento, na seguinte seqüência: joelho de estendido para flexionado para os estiramentos médios ou altos do semimembranoso e do semitendinoso, e de flexionado para estendido, para os estiramentos do bíceps inferior e lateral. Após a fase inicial, utilizamos, calor para aumentar a vasodilatação na área lesionada, facilitando o aporte de nutrientes, células de defesa e fibroblastos (para o processo de cicatrização). Com isso, pode-se usar: ultra-som contínuo, compressas quentes e até mesmo Ondas curtas (se a área for muito extensa), associando sempre aos exercícios de fortalecimento e condicionamento.
A evolução do tratamento deve obedecer a uma avaliação diária da dor, amplitude do movimento, força muscular e a sensação subjetiva do paciente. Procura-se sempre que possível intercalar as sessões de fortalecimento com as de condicionamento aeróbico, seguidos pelas atividades de alongamentos. Lembrar-se de incluir também os exercícios isométricos (sem movimento, só a contração do músculo), do quadríceps e dos isquiotibiais (posteriores de coxa), utilizando carga adequada ao paciente e à fase da lesão. Pode-se utilizar também, modalidades elétricas que produza contrações musculares, para estimular a amplitude do movimento e, conseqüentemente, diminuir a dor e o espasmo muscular. Sobre os exercícios de fortalecimento, entendo que estes devem priorizar os músculos envolvidos na lesão: isquiotibiais, sem deixar de se preocupar com os antagonistas: quadríceps, e os estabilizadores laterais e mediais: adutores, abdutores e rotadores.
À medida que o tratamento avança, incluir os exercícios de propriocepção: refere-se à percepção consciente e inconsciente do posicionamento articular. Dentre os proprioceptores destacamos: os mecanorreceptores articulares: corpúsculo de Pacini, corpúsculos de Meissner e terminações nervosas livres. Estes estão localizados nas articulações e são responsáveis por fornecerem informações proprioceptivas quanto ao posicionamento articular. Verifica-se, também, os mecanorreceptores tenomusculares: os fusos musculares, presentes nos músculos que detectam alterações no comprimento e na velocidade do músculo. Os órgãos tendinosos de Golgi (OTG), localizados no tendão e na junção tendão-músculo, detectam o nível de tensão muscular. Ao menor sinal, protegem a unidade músculo-tendão quanto ao excesso de tensão que podem provocar danos. Estes proprioceptores é que levam informação da periferia para o córtex cerebral, produzindo resposta eferente motora de: alívio da dor, controle de movimento, resposta funcional eficaz, etc. Incluir exercícios de: estabilização dinâmica, requer a antecipação e a reação às cargas articulares, obtém-se colocando a articulação em situações vulneráveis, nas quais o equilíbrio dinâmico é estabelecido em situações controladas. Os exercícios de equilíbrio (giroplano, cama elástica, pedalinho, balancinho, caixa de areia etc.) e os exercícios pliométricos (saltos com obstáculos e em profundidade), são bastante adequados.
Após esta seqüência, utilizar os exercícios de recuperação funcional que têm como objetivo retornar o atleta ao nível de atividade antes da lesão, restaurando a estabilidade funcional e dos padrões de movimentos específicos para o esporte, minimizando o risco de nova lesão. Devem induzir “perturbações” articulares inesperadas, deslocamentos laterais, saltos, saltitos, deslocamentos frontais e de costas, exercícios com bola, chutes, arremessos, etc. O paciente com estiramento grau I pode continuar suas atividades normais, mas sendo observado para não agravar a lesão e adotando procedimentos fisioterapeuticos. O paciente com estiramento grau II requer 5 a 21 dias de recuperação e nas lesões grau III de 3 a 12 semanas. Em todos os casos, a alta do paciente será determinada se os exercícios pliométricos e as atividades funcionais forem realizadas sem dor.

Até a próxima!!!!
Marcelo Luiz de Souza
Fisioterapeuta - Crefito 2: 74644-F
marceloluizsouza@globo.com
Tels: (21) 78526135 (ID: 83*17295) e 9627-5472

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Preparador físico e auxiliar técnico?

Papel do preparador físico no futebol moderno extrapola o viés fisiológico, sendo necessária a sua participação na formatação do modelo de jogo da equipe
Lucas Vinícius Nascimento e Renato Buscariolli de Oliveira
Olá, caros amigos!
Excepcionalmente para a confecção deste artigo, abdiquei do meu companheiro de escrita, William Sander Figueiredo, e estou acompanhado de um novo colega de profissão – Lucas Vinícius Nascimento –, o qual tive o prazer de conhecer na cidade de Laranjal Paulista, em julho, em um destes torneios de férias realizados com atletas das categorias de base. Aliás, fazendo um adendo a este tipo de torneio, cuja finalidade é propiciar aos atletas a possibilidade de interagirem com equipes de outros estados, reforço a importância destes para nós profissionais do futebol, uma vez que nos permite avaliar a qualidade do trabalho desenvolvido, assim como a realização de novos contatos.
Vale lembrar que me refiro aos torneios de alto nível, com representantes de grandes clubes brasileiros ou equipes oriundas de novos projetos que contam com excelente infraestrutura e profissionalismo.
Finda esta introdução, o tema que trazemos à tona surgiu de nossas conversas acerca das condutas por nós adotadas em nosso dia-a-dia de treino. De forma sucinta, nós, “preparadores físicos”, vimos por meio deste explicitar o quão importante é para este profissional conhecer o jogo de futebol e suas nuances técnico-táticas e não apenas conhecer os aspectos físico e fisiológicos deste mesmo jogo.
Assim sendo, acreditamos que a tradicional “preparação física” concebida de forma fragmentada e descontextualizada do jogo não cabe mais no futebol moderno. Aliás, esta prática vai contra um dos princípios mais antigos do treinamento desportivo, o princípio da “especificidade” que, em suma, afirma que o treinamento deve ter uma íntima relação com a modalidade praticada. Ou seja, no futebol, o treinamento deve ter uma íntima relação com o jogo e possibilitar a vivência de situações que venham a potencializar o desempenho dos atletas no jogo em si. Logo, se os treinamentos devem ser realizados neste contexto, a função do “preparador físico” não se limita ao planejamento e ao controle do treino, dado pela quantificação do número de sprints, da frequência cardíaca ou da distância percorrida. Agora, o papel do preparador físico vai além, já que somado a este conhecimento fisiológico do que sucede com a manipulação das variáveis do treino (volume, intensidade, densidade, aspectos metabólicos etc.) cabe ao mesmo subsidiar o treinador com possibilidades e ideias para que os objetivos pretendidos no planejamento técnico-tático sejam atingidos.
Assim, na preparação física moderna, a complexidade do jogo nos inviabiliza de reproduzir treinos antigos e ultrapassados concebidos através de uma visão fragmentada, já que estes não preparam para o que realmente irá acontecer em uma partida. Com o intuito de exemplificar as linhas até então descritas, trazemos aqui alguns dados gerados em uma sessão de treino da categoria infantil executada no mês de junho deste ano.
Partindo do princípio que as valências físicas são desenvolvidas como consequências das situações de jogo ocorridas durante o treinamento e não como objetivo principal da sessão e baseados na teoria da complexidade, monitoramos um atleta (sub-15) durante uma sessão de treino. O objetivo é explicitar ao leitor como é possível através de pequenos ajustes e conhecimento teórico-prático, auxiliar o técnico no desenvolvimento do seu trabalho (modelo de jogo), assim como monitorar e adequar o desempenho dito “físico” dentro deste contexto.
De acordo com o exposto, o objetivo do treino em questão é trabalhar a transição defensiva da equipe. Assim, de acordo com o modelo de jogo pretendido, definiu-se como regra de ação deste princípio operacional recuperar a posse da bola o mais rápido possível, atacando a mesma sempre que estiver sem sua posse. Logo, nenhum objetivo físico foi traçado previamente.
O monitoramento do treino se deu através da utilização de um cardiofrequencímetro somado a um acelerômetro. O atleta monitorado foi um jogador de meio-campo e o treino foi dividido em três etapas:
1ª etapa - aquecimento (relação com a bola) – total: 15 minutos
• Muita mobilidade articular, mobilização muscular geral, alguns fundamentos com bola em duplas (ênfase para perna não dominante) e alguns saltos para realizar o cabeceio;
2ª etapa - jogo geral de transição defensiva – total: 20 minutos (4 x 5’)
• Espaço de 15x15 metros, 4 x 2. Posse de bola feita em superioridade numérica. Uma vez perdida a posse de bola, evitar que a bola transite para a outra metade do campo (Figura 1). Pausa de 1’
3ª etapa - médio jogo de transição defensiva – total: 40 minutos (2x20’) 
• Espaço de 50m x 30m, 10 x 10. Uma equipe ataca o gol grande (com goleiro) e a outra quatro golzinhos laterais. Pontua-se fazendo gols ou recuperando a bola no mesmo quadrante em que se perdeu a posse (Figura 2).
Dentro do planejamento traçado pela comissão, o objetivo do treino foi alcançado, uma vez que os atletas conseguiram se organizar para recuperar a posse da bola tanto no jogo menos complexo (Figura 1) quanto no jogo de maior complexidade, cuja estruturação do espaço exigia uma maior compactação e flutuação em virtude da presença do grande número de alvos (gols). Estes jogos, denominados gerais (ou mesmo “Conceituais”) podem evoluir para os chamados “Conceituais em Ambiente de Jogo”, nos quais as regras aproximam-se do jogo formal. Em nosso exemplo, uma possibilidade seria: espaço de 100m x 60m, dividir o meio-campo ofensivo em quatro quadrantes (30m x 25m). Uma vez perdida a posse, caso consiga recuperar no mesmo quadrante = 1 ponto.
Em relação ao controle das variáveis físicas do treino, o atleta monitorado percorreu uma distância de 5.800m. Destes, 827m foram a uma intensidade baixíssima (0km/ a 3,7km/h), 1937m em intensidade relativa a caminhada e corrida lenta (3,8 a 6,0 km/h), 1576m de trote ou corrida leve (6,1 a 8,7 km/h), 823m de corrida média a rápida (8,8 a 12 km/h), 514m muito rápido (12,1 a 19,3 km/h) e 123m em máxima velocidade (19,4 a 30 km/h). A média da frequência cardíaca do atleta foi de 151bpm e a máxima 197bpm.
No que tange o papel do preparador físico nos ajustes do treino (além da escolha das regras), podemos destacar a determinação do espaço de jogo, o número de participantes e a densidade do treino (relação estímulo/pausa). Desta forma, o 1º jogo, em decorrência de um menor espaço de execução e menor número de participantes, foi realizado em uma alta intensidade, já que o atleta permaneceu cerca de 80% do tempo jogado com uma frequência cardíaca (FC) média acima da correspondente ao limiar anaeróbio. Desta forma, a intensidade média foi mais alta do que a desenvolvida no jogo formal, no qual o jogador permanece em média 30% do tempo acima da intensidade correspondente ao limiar anaeróbio (Buscariolli, 2007). Logo, fez-se necessário o ajuste do tempo em quatro blocos de cinco minutos para que a intensidade (assim como a qualidade técnica) não caísse ao longo do treino.
Na outra atividade, como o espaço e o número de participantes era maior, pode-se utilizar um maior tempo de execução antes de pausa, apesar de a intensidade ter sido relativamente alta (50% do tempo com a FC com valores supralimiares). De acordo com os dados, podemos dizer que este tipo de atividade parece ser eficaz para adaptar a capacidade aeróbia dos atletas e pequenos ajustes podem otimizar as possíveis adaptações físicas geradas neste sentido. Como conclusão, podemos dizer que o papel do preparador físico no futebol hoje extrapola o viés fisiológico, sendo necessária a sua participação como um “auxiliar técnico”. Em um futuro próximo, essa conduta pode vir a ser a norma dentro do treinamento no futebol. Vale destacar que um tipo de conhecimento não exclui o outro e não podem ser classificados como mais ou menos importantes.
Para finalizar, uma citação acerca do jogo (na essência da palavra) encontrada no livro “O Jogo – As leis naturais que regulam o acaso”, de Manfred Eigen e Ruthild Winkler, que talvez explique por que existem certas coisas que a ciência ainda não explica sobre futebol:

 
“O acaso e as regras são os elementos do jogo. O jogo começou entre as partículas elementares, os átomos e as moléculas, sendo hoje continuado pelas células do nosso cérebro. Não foi o homem que inventou o jogo, mas é o jogo, e apenas o jogo, que torna o homem mais completo.”

Um grande abraço e até a próxima!
Bibliografia
Buscariolli R, Lizana CR, Fontão FJ, Figueiredo WS, Souza R, Silva FOC, Scaglia A. Periodização integrada no futebol: É possível treinar a capacidade aeróbia apenas no contexto do jogo? XXX Simpósio Internacional de Ciências do Esporte – CELAFISCS – São Paulo-SP – 2007.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

A bola não entra por acaso

O estreitamento das relações entre administração e economia em uma agremiação, pode ser decisivo no sucesso dentro de campo
O Internacional acaba de conquistar, pela segunda vez, em 5 anos, a Copa Libertadores da América.
Não foi por acaso.
Nada é por acaso.
O processo evolutivo na gestão do clube passou por um período de diagnóstico, do qual o grande professor Medina foi o protagonista, na gestão anterior ao grupo que está comandando o clube há 8 anos. Naquela ocasião, a devassa no clube sugeria um conjunto de mudanças que passavam da cozinha ao ponta-esquerda.
O Internacional passou a equilibrar-se na gestão e nas finanças a partir de boas campanhas esportivas nas competições em que disputava. Essa é a premissa que interessa: um clube de futebol vive de conquistas esportivas, ainda que parciais. Participar de um torneio continental de clubes já é uma conquista.
O FC Barcelona – que, apesar da grandiosidade institucional e esportiva, foi derrotado pelo próprio Internacional no Mundial Interclubes em 2006 – é exemplo de gestão.
Tive a oportunidade e o privilégio de, no ano passado assistir a uma palestra proferida pelo ex-diretor econômico do clube na gestão 2003-2008, de Joan Laporta. A palestra inspirou o livro A Bola não Entra por Acaso, que acabo de ler e se recomenda como leitura obrigatória na área de gestão.
É, diretor econômico é algo mais amplo e complexo que apenas diretor financeiro ou contador (controller para os que defendem o vocabulário corporativo em inglês). 
E um clube como o Barça o tem em seus quadros. Duvido que exista um diretor econômico no futebol brasileiro.
A economia, segundo o portal Wikipédia, consiste na produção, distribuição e consumo de bens e serviços. O conceito vem do grego oikos (casa) enomos (costume ou lei), ou também gerir, administrar: daí "regras da casa" (lar) ou "administração da casa".
É também a ciência social que estuda a atividade econômica, através do desenvolvimento das teorias econômicas, e que tem na administração a sua aplicação. Portanto, quanto mais próxima a administração da economia, mais um clube terá chances de “arrumar a casa” e buscar a performance esportiva, que é sua essência. Maiores, então, são as chances de racionalizar o planejamento e executá-lo.
Claro que é obrigatória a interpretação diagnóstica inicial para executar as mudanças com certa dose de ousadia e pulso administrativo.
Tal qual fez o Barcelona em 5 anos.
Tal qual fez o Internacional em 5 anos.
E que, se bem administrados segundo princípios da economia, podem projetar ciclos de crescimento mais longos.
Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

Utilização dos exercícios em cadeia cinética fechada no futebol

Escolha das atividades em treinamento de força pode ser o diferencial no decorrer de uma competição, buscando sempre especificidade e funcionalidade
Rafael Martins Cotta
A Copa do Mundo foi uma amostra de como o esporte está igual no que se diz respeito ao condicionamento físico. Equipes disputando minuto a minuto o resultado, tendo estas tradição no esporte ou não. Sabemos também que o futebol é uma das únicas modalidades que não podemos dizer antes do final da partida quem será o vencedor. O treinamento físico tem deixado os atletas em condições semelhantes, principalmente quando falamos de uma capacidade física tão importante como a força.
Sabemos que para se treinar esta capacidade devemos recorrer aos exercícios resistidos e logo pensamos nos aparelhos de musculação. Porém, seria mais inteligente da nossa parte se pensássemos na especificidade dos movimentos que os atletas realizam para realização de suas funções dentro da competição. Quais as articulações e músculos exigidos numa ação específica e como ela é realizada quando solicitado e qual o ou quais os exercícios que serão realmente importantes para que haja uma maior transferência para o gesto motor no momento mais importante do processo que é o jogo.
¹Entende-se por cadeia cinética a combinação de várias ações articulares que unem segmentos sucessivos, podendo esta ser dividida em aberta e fechada. Em cadeia cinética aberta (CCA) o segmento distal está livre para se mover e o movimento é produzido pela contração do agonista, a origem é fixa e a contração muscular produz movimento na inserção. Já em cadeia cinética fechada (CCF), o segmento distal está fixo e as partes proximais se movem, o movimento é funcional onde a suporte de peso com contração de ambos os grupos musculares (agonistas e antagonistas (CO-CONTRAÇÃO)), oferece propriocepção onde provê informação relacionada ao movimento, posicionamento, velocidade e aceleração articular e tensão músculo tendínea; seus exercícios para os membros superiores são usados para controle neuromuscular dos músculos que atuam para estabilizar a cintura escapular e realizam fortalecimento como os apoios e pranchas.
²Estudos biomecânicos relatam que os exercícios em cadeia cinética fechada oferecem uma maior segurança produzindo menos forças e estresses às estruturas que estão envolvidas no processo de reabilitação do que os exercícios em cadeia cinética aberta.
De acordo com as definições acima, começamos a entender o porquê das vantagens em se aplicar o treinamento em CCF. Abaixo vou expor alguns pontos que relevam o treinamento de força em CCF:

1. Os exercícios em CCF são funcionais;
2. Os exercícios em CCF são multiarticulares, ou seja, ao simular o movimento específico envolvem mais de uma articulação na execução do exercício;
3. Um conhecido exercício em CCF é o agachamento, que simula um salto que consequentemente é um excelente estimulador da potência muscular trabalhando os componentes elásticos;
4. Oferecem propriocepção sendo estes também exercícios preventivos trabalhando o sistema sensório motor através da geração de instabilidade;
5. Seus exercícios para membros superiores fortalecem o core que terá grande eficácia na prevenção de lesões e oferecerá uma maior sustentação para esta região na execução dos exercícios de agachamento, afundo, etc;
6. Para sua realização necessita-se apenas de barras, anilhas e halteres, onde estes podem ser levados para o campo com maior facilidade e oferecer uma maior e mais rápida transferência.
O treinamento em CCF deixa mais específica as sessões de treinamento de força, porém temos que conhecer nossos atletas para sabermos em que nível de movimento eles estão para poder ou não realizar determinados exercícios em CCF, e se tem ou não capacidade de suportar altos pesos como por exemplo num trabalho de força máxima. Fortalecer o core e as articulações através do sistema sensório motor são primordiais no treinamento e treinar em CCF favorece esses ganhos.
Exercícios como o meio-agachamento, agachamento profundo, avanço, afundo, recuo, agachamento sumô, stiff e agachamento lateral são exemplos de CCF, pois realizam movimentos semelhantes ao da modalidade, fortalecem músculos solicitados nos movimentos e trabalham de uma forma toda a região inferior. Como já descrito acima, os exercícios em CCF para os membros superiores têm grande importância com relação à prevenção no processo de treinamento.
A sua periodização pode ser composta por estes exercícios trabalhando com a ajuda de diferentes métodos para o ganho de força, em que para ganho de resistência de força podemos utilizar trabalhos em circuito por tempo (aproximadamente 30 segundos) ou 8-12 repts para hipertrofia e mais de 12 para resistência muscular - até três séries são necessárias para os ganhos de força de acordo com o período de preparação, no qual as pausas entre as séries devem ser determinadas de acordo com a intensidade do treino e o objetivo; para ganho neural visando aumentar o recrutamento de unidades motoras num trabalho de força máxima podemos utilizar aproximadamente oito séries (dependendo do número de exercícios) com até seis repts com 80 a 95% de uma ação voluntária dinâmica máxima mediante o teste, pausando de três a cinco minutos visando recuperar completamente as fontes energéticas, para ganho de potência podemos utilizar agachamentos com saltos utilizando como peso até 5% do peso corporal e também os exercícios de LPO (Levantamento de peso olímpico), como arranque e arremesso.
Pode-se também enriquecer este trabalho gerando mais instabilidade nos exercícios através de equipamentos simples, como o disco de instabilidade, pranchas de equilíbrio, camas-elásticas, balancins, etc., nos quais realizamos o exercício em cima destes deixando o mesmo mais difícil e conseqüentemente obtendo maiores ganhos.
Concluindo, é importante que antes de aplicar estes exercícios em nossos atletas, precisamos conhecer o grupo que temos em nossas mãos e verificar se os mesmos estão aptos a receber este tipo de treinamento ou se os mesmos precisarão ser submetidos a um período de adaptação para que futuramente o mesmo seja aplicado com mais eficácia. Os exercícios em CCF são seguros, porém requerem severo acompanhamento do/s preparador/res físico/os. Com a correção da postura, menos riscos de lesões, algo muito importante.
Referências¹http://www4.fct.unesp.br/docentes/fisio/masselli/2ano/6%20aula.pdf  
²Técnicas de Reabilitação em Medicina Esportiva - William E. Prentice - 3 edição