A postagem de hoje é sobre as cadeias cinéticas. Resolvi aprofundar um pouco a discussão sobre este tema uma vez que as informações disponíveis na internet abordam, em sua maioria, apenas a cadeia cinética fechada em lesões de joelho.
Pois bem, então vamos começar pelo princípio:
Histórico
Inicialmente é importante saber que historicamente, os princípios e conceitos da cinesiologia humana e da biomecânica do movimento evoluiram a apartir do estudo da engenharia mecânica. O conceito de cadeia cinética originou-se em 1955, quando Steindler utilizou teorias de engenharia mecânica de cinemática fechada e conceitos de ligações (links) para descrever a cinesiologia humana. De acordo com este modelo, cada um dos segmentos articulares do corpo envolvidos em um determinado movimento constitui uma ligação ao longo das cadeias cinéticas.
Assim, no caso de uma cadeia cinética fechada, podemos considerar que vários segmentos rígidos sobrepostos estão conectados em uma série de juntas móveis. Este sistema permite o movimento previsível de uma junta baseado no movimento de outras juntas. Na extremidade inferior do corpo humano, cada segmento ósseo pode ser visto como o segmento rígido. De foma similar, as articulações sinoviais talocrural, subtalar , tibiofemoral e coxo-femoral como juntas de conexão. Esta descrição é meio confusa, mas ela refere-se ao modelo utilizado em engenharia e pode ser exemplificado na imagem abaixo. - Se algum engenheiro quiser comentar, sinta-se a vontade.
Aplicando estes conceitos ao movimento humano, Steindler observou que dependendo da carga na “junta terminal”, era possível classificar as cadeias cinéticas em duas categorias distintas: A Cadeia Cinética Aberta (CCA) e a Cadeia Cinética Fechada (CCF). Ele observou que o recrutamento muscular e o movimento das articulações eram diferentes quando o pé ou a mão estavam livres e quando o pé ou a mão estavam fixados (ou ao trabalhar contra resistência considerável).
Sempre que o pé ou a mão encontram resistência ou estão fixados, como na cadeia cinética fechada, os movimentos dos segmentos mais proximais ocorrem em um padrão previsível. Se o pé ou a mão se movem livremente no espaço em uma cadeia aberta, os movimentos que ocorrem em outros segmentos da cadeia não são necessariamente previsíveis.
Tradicionalmente, os protocolos de fortalecimento em reabilitação utilizam exercícios em CCA como, por exemplo a flexão e extensão de joelho com o paciente sentado e com carga. Mas apesar da popularidade atual dos exercícios em CCF, devemos enfatizar que tantos os exercícios em CCA quanto CCF tem seu papel no processo de reabilitação.
CADEIA CINÉTICA ABERTA
Um movimento em CCA é definido como aquele que ocorre quando o segmento distal de uma extremidade move-se livremente no espaço, resultando no movimento isolado de uma articulação (ex: a perna se movimentando na fase de balanço da marcha, o ato de chutar uma bola, o aceno de mão ou o ato de levar um copo a boca para beber água ).
CADEIA CINÉTICA FECHADA
Um movimento em CCF é definido como aquele nas quais as articulações terminais encontram resistência externa considerável a qual impede ou restringe sua movimentação livre.
Exemplos de atividades de CCF dos MMSS são: o exercício de flexão de braço, a utilização dos braços para se levantar de uma cadeira, o apoio dos membros superiores durante a a marcha com muletas. Exemplos de atividades de CCF dos MMII: descer escadas, leg press e agachamentos.
EXERCÍCIOS EM CADEIA CINÉTICA ABERTA VERSUS CADEIA CINÉTICA FECHADARecentemente, o conceito de CCF tem recebido considerável atenção como técnica de reabilitação eficiente e útil, particularmente na reabilitação dos membros inferiores.Ambas CCA e CCF oferecem vantagens e desvantagens distintas no processo de reabilitação. A escolha em se usar uma ou outra vai depender do objetivo de tratamento.
Características dos exercícios em CCF incluem forças compressivas articulares aumentadas, aumento da congruência articular e portanto maior estabilidade, redução das forças de cisalhamento, redução das forças de aceleração, forças de resistência aumentadas, estimulação dos proprioceptores e melhoria da estabilidade dinâmica. Todas estas características estão associadas ao suporte de peso. Assim, atividades em CCF ajudam a reforçar a sincronização dos padrões de ativação muscular tanto para agonistas quanto para antagonistas, que se ativam durante estabilização e deambulação.
Entre as características dos exercícios em CCA estão: forças de aceleraçãomaiores, forças de distração e rotacionais mais intensas, forças concêntricas de aceleração e forças de desaceleração excêntricas. Estas são em geral características de atividades sem descarga de peso.
A partir de uma perspectiva biomecânica, acredita-se que exercícios em CCF sejam mais seguros e que produzam forças potencialmente menos danosas a estruturas em processo de reparo pós lesão do que os exercícios em CCA.
A coativação ou co-contração de músculos agonistas e antagonistas deve ocorrer durante os movimentos normais para gerar estabilização articular. A co-contração que ocorre durante atividades em CCF diminuem as forças de cisalhamento que agem sobre a articulação, assim protegendo os tecidos moles em processo de recuperação, os quais de outra forma poderiam ser danificados em atividades em CCA.
Também argumenta-se que atividades em CCF, particularmente nos membros Inferiores seriam mais funcionais do que as CCA pelo fato de envolverem descarga de peso.
Com exercícios em CCA, o movimento geralmente é isolado em uma única articulação. Atividades em CCA teriam como inidcação exercícios para aumentar força ou amplitude de movimento. Eles podem ser aplicados em uma única articulação manualmente, como nos exercícios de PNF ou por meio de alguma resistência externa utilizando therabands.
A preferência em realizar atividades em CCF sobre a CCA é baseada na premissa de que exercícios em cadeias cinéticas fechadas, particularmente nos membros inferiores parecem replicar tarefas funcionais melhor do que as CCA . Isto porque a CCF parece permitir toda uma cadeia muscular se exercitar ao mesmo tempo. Além disso, exercícios em CCF demonstraram melhorar a congruência articular, diminuir as forças de cisalhamento e estimular os mecanoceptores articulares utilizando carga axial e aumento de forças compressivas sobre a articulação.
Entretanto, é importante ressaltar que a vasta maioria das atividades funcionais envolve uma combinação das cadeias cinéticas abertas e fechadas, muito mais do que meramente uma ou outra. Assim, atividades funcionais são melhor vistas como parte de um continuum entre ações de cadeias abertas e fechadas que se alternam e complementam para gerar o movimento normal.
RESUMO DA ÓPERA:As seguintes características são comuns a atividades em Cadeia Cinética Fechada:
(1) Interdependência do movimento articular (Ex: flexão de joelho depende da dorsiflexão do tornozelo).(2) O movimento ocorre proximal e distal ao eixo da articulação de modo previsível (ex: flexão de joelho é acompanhada pela flexão, rotação interna e adução de quadril, e pela dorsiflexção de tornozelo e rotação interna da tíbia).
(3) As contrações musculares são predominantemente excêntricas, associada a estabilização dinâmica muscular sob a forma de co-contração.(4) Presença de maiores forças de compressão articular resultando em menor cisalhamento e estabilização articular garantida pela maior congruência articular.
(5) Maior estímulo proprioceptivo devido ao maior número de mecanoceptores estimulados.
As seguintes características são comuns a atividades em Cadeia Cinética Aberta:
(1) Independência do movimento articular (ex: a flexão do joelho independe da posição do tornozelo).
(2) Movimento ocorrendo no eixo distal da articulação (ex: o resultado da flexão de joelho é apenas o movimento da perna).
(3) Contrações musculares predominantemente concêntricas.
(4) Ativação dos mecanoceptores limitada à articulação em movimento e estruturas
próximas.
REFERÊNCIAS
Closed kinetic chain exercise: a comprehensive guide to multiple joint exercise
Orthopedic examination, evaluation, and intervention
Techniques in musculoskeletal rehabilitation
Therapeutic exercise: moving toward function
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