Orientar o Barcelona cansa. Principalmente, quando se tem de competir com o Real de Mourinho e de Cristiano Ronaldo. Mas outra história será escrita. Mais cedo ou mais tarde
Tenho o hábito de perguntar aos meus alunos de Motricidade Humana, designadamente aos de Desporto, o que pretendem ser eles, findo o seu curso universitário. Em 1982 (precisamente há trinta anos!) levantei igual questão ao José Mourinho, era ele aluno do primeiro ano da licenciatura em Educação Física e Desporto do Instituto Superior de Educação Física de Lisboa. Respondeu-me, aprumado e sem reticências: “Quero ser treinador de futebol”.
Olhei para ele, com simpatia, dada a convicção manifestada por um jovem de 18 anos de idade, mas não deixei de acrescentar: “Então não se esqueça que, para saber de futebol, é preciso saber mais do que futebol”.
O atual treinador do Real Madrid muitas vezes lembra o conselho que naquele momento me ocorreu e tem mesmo a generosidade de afirmar que nunca mais o esqueceu, ao longo da sua vida.
No seu primeiro ano de treinador, no F.C. Porto e no primeiro livro de Luís Lourenço, sobre o seu amigo José Mourinho, não tive receio em escrever no prefácio que o José Mourinho estava para o treino como Pelé e Maradona para a prática do futebol.
Embora já me tenha enganado muitas vezes, desta vez não me enganei. Líder nato, inteligente, perspicaz, corajoso, em constante busca por mais informação e fazendo da sua equipa a sua segunda família – a aposta nos seus êxitos era um risco reduzido.
No entanto, ao fim de treze títulos (poderão ser catorze, se os catalães vencerem a Taça do Rei, no próximo dia 23 de Maio), no espaço de quatro anos, e ao leme de uma equipa que realizou exibições memoráveis – Josep Guardiola, de 41 anos de idade, pode também apresentar um currículo admirável.
Quando, no passsado dia 27 de Abril, ele surpreendeu o mundo, ao anunciar, emocionado, que terminará o seu vínculo profissional ao Barcelona, no final da presente época, o seu nome já se encontrava gravado a letras de oiro, na História do Barcelona e na História do Futebol.
Discípulo de Cruyff, vivendo de uma filosofia política que é a alma da Catalunha, antigo jogador internacional de futebol e pessoa de estudo constante – Josep Guardiola surge a não temer cotejo com qualquer treinador de futebol. Mesmo com o primeiro de todos, o José Mourinho...
No anúncio da partida de Camp Nou, teve a seu lado Iniesta, Xavi, Puyol, Valdés, Piqué, Fabregas, Busquets e Pedro. Faltou Messi, três vezes Bola de Ouro sob a liderança de Guardiola, que explicou assim a sua ausência: “Preferi não estar presente na conferência do Pep, porque sei que os jornalistas dariam grande relevo à minha emoção e eu não queria que o fizessem”. Mas no treino Messi e Guardiola abraçaram-se, num abraço que parecia não ter fim. Como o referiu, na conferência de imprensa: “Vou continuar a ser treinador, mas não quero voltar em breve”.
Orientar o Barcelona cansa. Principalmente, quando se tem de competir com o Real de Mourinho e de Cristiano Ronaldo. Talvez resida na saída do Pep Guardiola do Barcelona uma das grandes vitórias do José Mourinho: é que o Barcelona, sem o Guardiola, não será o mesmo, na próxima época.
Com 42 anos de idade, Tito Vilanova, o seu sucessor, é “um homem da casa”; conhece, por dentro e por fora, o Barcelona. Mas não sei se tem o génio de Guardiola! No meu modesto entender, sem o Guardiola, o Barcelona, em 2013, arrisca-se a ser, de novo, o segundo do Campeonato Espanhol.
Jacques Derrida, no seu livro Spectres de Marx (Galilée, Paris, 1993), adianta que, com o neoliberalismo mundializado, se chegou ao fim, não da História, como queria Fukuyama, mas de uma certa história. No Barça, a história de Cruyff e de Guardiola findou. Outra virá, mais tarde, ou mais cedo. Aliás, no Barça, continua a jogar Lionel Messi. No entanto, o clube, uma das expressões do povo da Catalunha, viverá muito para além de qualquer jogador ou treinador, que o servirem.
O ex~presidente Joan Laporta deixou, na Imprensa, um agradecimento sentido a Guardiola: “Obrigado, Pep, por tudo o que nos deste”. Tudo é tempo e outros tempos hão-de vir. Mas, para já, o Mourinho vai ganhar.
*Antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.
Olhei para ele, com simpatia, dada a convicção manifestada por um jovem de 18 anos de idade, mas não deixei de acrescentar: “Então não se esqueça que, para saber de futebol, é preciso saber mais do que futebol”.
O atual treinador do Real Madrid muitas vezes lembra o conselho que naquele momento me ocorreu e tem mesmo a generosidade de afirmar que nunca mais o esqueceu, ao longo da sua vida.
No seu primeiro ano de treinador, no F.C. Porto e no primeiro livro de Luís Lourenço, sobre o seu amigo José Mourinho, não tive receio em escrever no prefácio que o José Mourinho estava para o treino como Pelé e Maradona para a prática do futebol.
Embora já me tenha enganado muitas vezes, desta vez não me enganei. Líder nato, inteligente, perspicaz, corajoso, em constante busca por mais informação e fazendo da sua equipa a sua segunda família – a aposta nos seus êxitos era um risco reduzido.
No entanto, ao fim de treze títulos (poderão ser catorze, se os catalães vencerem a Taça do Rei, no próximo dia 23 de Maio), no espaço de quatro anos, e ao leme de uma equipa que realizou exibições memoráveis – Josep Guardiola, de 41 anos de idade, pode também apresentar um currículo admirável.
Quando, no passsado dia 27 de Abril, ele surpreendeu o mundo, ao anunciar, emocionado, que terminará o seu vínculo profissional ao Barcelona, no final da presente época, o seu nome já se encontrava gravado a letras de oiro, na História do Barcelona e na História do Futebol.
Discípulo de Cruyff, vivendo de uma filosofia política que é a alma da Catalunha, antigo jogador internacional de futebol e pessoa de estudo constante – Josep Guardiola surge a não temer cotejo com qualquer treinador de futebol. Mesmo com o primeiro de todos, o José Mourinho...
No anúncio da partida de Camp Nou, teve a seu lado Iniesta, Xavi, Puyol, Valdés, Piqué, Fabregas, Busquets e Pedro. Faltou Messi, três vezes Bola de Ouro sob a liderança de Guardiola, que explicou assim a sua ausência: “Preferi não estar presente na conferência do Pep, porque sei que os jornalistas dariam grande relevo à minha emoção e eu não queria que o fizessem”. Mas no treino Messi e Guardiola abraçaram-se, num abraço que parecia não ter fim. Como o referiu, na conferência de imprensa: “Vou continuar a ser treinador, mas não quero voltar em breve”.
Orientar o Barcelona cansa. Principalmente, quando se tem de competir com o Real de Mourinho e de Cristiano Ronaldo. Talvez resida na saída do Pep Guardiola do Barcelona uma das grandes vitórias do José Mourinho: é que o Barcelona, sem o Guardiola, não será o mesmo, na próxima época.
Com 42 anos de idade, Tito Vilanova, o seu sucessor, é “um homem da casa”; conhece, por dentro e por fora, o Barcelona. Mas não sei se tem o génio de Guardiola! No meu modesto entender, sem o Guardiola, o Barcelona, em 2013, arrisca-se a ser, de novo, o segundo do Campeonato Espanhol.
Jacques Derrida, no seu livro Spectres de Marx (Galilée, Paris, 1993), adianta que, com o neoliberalismo mundializado, se chegou ao fim, não da História, como queria Fukuyama, mas de uma certa história. No Barça, a história de Cruyff e de Guardiola findou. Outra virá, mais tarde, ou mais cedo. Aliás, no Barça, continua a jogar Lionel Messi. No entanto, o clube, uma das expressões do povo da Catalunha, viverá muito para além de qualquer jogador ou treinador, que o servirem.
O ex~presidente Joan Laporta deixou, na Imprensa, um agradecimento sentido a Guardiola: “Obrigado, Pep, por tudo o que nos deste”. Tudo é tempo e outros tempos hão-de vir. Mas, para já, o Mourinho vai ganhar.
*Antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.
Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia.
Esse texto foi mantido em seu formato original, escrito na língua portuguesa, de Portugal.
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